LETÍCIA RODRIGUES BORGES – “COSTURAS E VESTIR OS
RESTOS DO CORPO”
Eu flutuava e sentia as penas caindo, comecei a tirar as penas, as asas,
o sangue, as asas, a carne, foi tudo se desfazendo sobre o chão. Aquilo não
doía, mas libertava, eu ficava cada vez mais forte.
Fui retirando a pele, a carne, o sangue, os olhos, os ossos, meu
coração, as veias, tudo pesava mas eu retirei e deixei escorrendo. Eu estava
livre de mim, daquele corpo que pesava e oprimia e contemplei tudo no chão.
Naturalmente o meu corpo se materializou e os cacos no chão me revestiram e
eles eram uma espécie de armadura feita sob medida, que deixou o meu corpo
fácil, mais vivo e confortável.
O que eu vestia não era uma mera roupa, mas meu próprio corpo. Então eu
vou, sentindo que meu coração não era mais um órgão interno, agora ele era
externo, exposto para todos verem como era uma fratura exposta que expõe o
osso. Não é uma ferida, sim uma forma de ser mais viva. E meu coração estava
protegido e forte, apesar de estar tão exposto.
E agora eu vivia mais intensamente que tudo e flutuei livre, empoderada
vestindo o que sou e costurei isso no meu corpo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário